Prof. Doutor Paulo de Tarso Domingues *
O fenómeno da corrupção – que é comum e transversal a todos países, constituindo um flagelo global que está a minar os alicerces das sociedades modernas e que, por isso, se torna imperioso combater – é mais visível no setor público, mas ele verifica-se também no setor privado.
Em Portugal, de resto, foi já aprovada uma lei criminalizadora de atos de corrupção na atividade privada (Lei n.º 20/2008), a qual, contudo, penaliza essencialmente a corrupção de trabalhadores. Ora, tão ou mais importante do que sancionar os trabalhadores, é seguramente penalizar os comportamentos fraudulentos praticados pelos administradores das sociedades.
O direito português consagra já, no entanto, um regime particularmente gravoso, aplicável aos atos de corrupção praticados por administradores. Desde logo, tais comportamentos poderão subsumir-se no crime de infidelidade ou no crime de abuso de confiança. Por outro lado, os atos de suborno – os chamados contratos de pagamento de “luvas” – são sempre contrários aos bons costumes e, por isso, nulos (cfr. artigo 280.º do Código Civil), o que tem tem várias implicações:
i) desde logo, tal significa que o subornado nunca pode exigir o pagamento das “luvas” prometidas que ainda não lhe tenham sido pagas; e
ii) o subornador poderá sempre exigir a devolução das “luvas” que pagou;
Ou seja, a sociedade poderá sempre recusar o pagamento das “luvas” que tenham sido prometidas pelo seu administrador, bem como exigir a devolução dos subornos que, eventualmente, tenham sido por ele pagos.
iii) finalmente, a sociedade poderá sempre destituir com justa causa o administrador que pratica tais atos e responsabilizá-lo pelos prejuízos causados à própria sociedade, bem como a terceiros.
Pode, pois, concluir-se que o direito português já dispõe de um arsenal jurídico adequado para o combate à corrupção no setor privado, que, só por si, deveria ser dissuasor da prática de tais atos. A grande dificuldade nesta sede reside, no entanto, na prova dos atos de suborno, uma vez que esta é uma atividade subterrânea…
Em todo o caso, será extremamente importante que os nossos tribunais apliquem com rigor e severidade o regime legal, sempre que se deparem com uma situação de corrupção, também no setor privado. Isso será decisivo para travar este cancro que está a corroer a nossa sociedade!
* Director da Faculdade de Direito, da Universidade do Porto